
Não é novidade para ninguém que a indústria fonográfica americana tem se atualizado à força. Com a compra cada vez menor de álbuns físicos e o aumento do mercado de streamings, gravadoras e artistas precisam aprender a se encaixar no novo contexto mercadológico e encontrar alternativas criativas para chegar ao topo das paradas. E uma dessas alternativas é o Tiktok.
O digital mudou diversos segmentos no mundo, e o consumo de música não ficou de fora. Se no oriente as vendas de cópias físicas de álbuns é algo cultural – e alguns artistas americanos como Taylor Swift já entenderam o recado e passaram a replicar seus métodos – no ocidente, os streamings em Youtube, Spotify, Apple Music e outras ferramentas representam uma grande fatia na construção de um hit.
Se antes vender 5 milhões de cópias puras era o foco de quase todos os artistas, agora estar no Top 10 dos mais ouvidos mundialmente no Spotify representa mais longevidade – e até um maior lucro – do que só a venda de álbum e singles em si.
Hoje, o que conta é conseguir uma boa exposição. Ficar apenas em uma boa posição nos charts na primeira semana de um single – ou um álbum – já não representa, aos olhos da indústria (e do público mais aficionado) um sucesso arrebatador como antigamente.
Manter-se no topo por mais semanas – ou dentro do Top 20, no mínimo – garante chances maiores de conseguir espaço em programas de rádio e TV. Isso é fundamental para propagar a boa campanha durante meses. A palavra de ordem agora é estabilidade.
Os esforços das gravadoras são diversos: inclusão de músicas nas playlists dos streamings, compra de banners no – em breve finado – iTunes, tentar garantir execuções nas rádios e divulgação nos principais programas de TV e rádio. Apesar disso, muitos artistas não conseguem fazer com que suas músicas ganhem a notoriedade esperada. Isso acontece porque a indústria musical é extremamente competitiva.
E aí que entra o TikTok.
Você sabe o que é o TikTok?
Comprado pela empresa chinesa ByteDance no fim de 2017, o aplicativo tem se provado uma segunda chance para vários artistas da indústria. Com mais de 1 bilhão de usuários ativos por mês, o TikTok é o aplicativo mais popular do mundo, ultrapassando em número de downloads mensais o Facebook e o Instagram.
Com uma proposta de videos curtos e recursos de edição dinâmicos, o TikTok se provou a rede social mais amada pelos jovens, um público que – costumeiramente – alça artistas ao sucesso.
São os jovens que sobem hashtags no Twitter, que passam o dia no Amino criando tópicos sobre os seus ídolos ou votando em enquetes para ajudar bandas e artistas pouco conhecidos a ganharem o mundo. O apoio dos adolescentes é extremamente importante na indústria fonográfica desde antes do digital existir. O caso do grupo mexicano Rebelde / RBD está aí pra não nos deixar mentir.
Outro caso de fandom composto em sua maioria por adolescentes e que é o mais notável nesta era digital é o do grupo coreano BTS.
A BigHit, criadora do grupo mais famoso do mundo, estava indo à falência. Os integrantes entregavam panfletos nas ruas convidando as pessoas a comparecerem em seus concertos, além de viverem em um espaço simples, com poucos recursos. Com o uso inteligente das redes sociais, o fandom do BTS cresceu de uma forma tão assombrosa que, hoje, eles são as celebridades mais famosas do mundo.
O TikTok é a reformulação do aplicativo Musical.ly, que caiu nas graças dos adolescentes assim como aconteceu com o finado Vine. Por meio de um algoritmo único, o aplicativo usa vários recursos para dar projeção aos vídeos da plataforma, garantindo um alcance que nenhuma outra rede – hoje em dia – possui. Se você quiser saber mais sobre como funciona o Tiktok, confira o artigo do Julio Moraes do Update or Die!
A ferramenta mescla duas coisas que nós sabemos que funciona muito na internet: conteúdo em vídeo e música. Pesquisas confirmam que o consumo de vídeo online é uma crescente no mundo. Em estudos mais recentes divulgados pela revista Rolling Stones, o consumo de música em streamings durante a quarentena despencou – mas aplicativos como o TikTok estão mais em alta do que nunca.
Por meio de desafios, o engajamento das pessoas dentro do TikTok tem criado novos parâmetros para a indústria fonográfica, garantindo uma segunda chance para artistas que já não acreditavam que músicas de 3 ou 4 anos atrás poderiam fazer sucesso nos dias de hoje. Um dos casos mais notórios da força do TikTok é o case da cantora Lizzo, conhecida pelo hit número 1 da Billboard “Truth Hurts”.
O que poucas pessoas sabem – a menos que acompanhem esses detalhes da indústria – é que a música Truth Hurts foi lançada em 2017. O clipe, que até o momento possui 192 milhões de visualizações, não havia ultrapassado a bolha da indústria e nem causado retornos expressivos em sua época de lançamento.
Entretanto, por meio de um desafio chamado DNA Test, os usuários do TikTok passaram a utilizar a música de Lizzo em seus vídeos. Isso fez com que a canção se tornasse conhecida por mais pessoas e, consequentemente, ganhasse projeção nos serviços de streaming.
Percebendo o crescimento da canção, a gravadora aproveitou para investir cada vez mais em apresentações de Lizzo em premiações e programas de TV, garantindo que o hit se tornasse número 1 na Hot 100 mesmo após 2 anos de seu lançamento (Truth Hurts alcançou a primeira posição no chart em setembro de 2019).
Obviamente, com o crescimento de Truth Hurts, várias outras canções do catálogo da artista começaram a ser descobertas. É o caso de Good as Hell que também começou uma escalada nos charts da Billboard e, futuramente, ganhou um remix com a cantora Ariana Grande.
Outro caso tão expressivo quanto o da Lizzo é o do cantor Lil Nas X e seu hit Old Town Road. Graças a um desafio do TikTok, a música escalou a parada de singles da Billboard e estabeleceu um novo recorde: se tornou a canção com mais semanas em primeiro lugar na história da música americana, permanecendo em número 1 por impressionantes 17 semanas consecutivas. O recorde anterior era dividido entre o smash hit “Despacito“, de Luis Fonsi e Daddy Yankee e “One sweet day” do ícone da música americana Mariah Carey.
O recorde se torna ainda mais impressionante quando analisamos a carreira do cantor: Old Town Road era seu single de estreia de um EP que seria lançado logo depois. Com apenas uma canção, Lil Nas X passou de um desconhecido com 5,62 dólares em sua conta bancária para um artista com 2 grammys e um net worth avaliado na casa dos 4 milhões de dólares.
A escalada de Old Town Road nos charts não foi, nem de longe, fácil para o cantor. Misturando ritmos como Country, Hip-Hop e Trap, a faixa sofreu boicote por parte dos artistas country mais conservadores – além de vários músicos do cenário do hip-hop.
O boicote foi tão forte que a faixa de Lil Nas X foi retirada do chart de música country da Billboard. Com a afirmação de não ser “country o suficiente”, Lil Nas X escalou Billy Ray Cyrus, uma lenda da música americana, para o remix de Old Town Road, impulsionando sua escalada até o primeiro lugar da Hot 100.
Percebendo o potencial da música – que acabou ganhando inúmeros remixes – a gravadora de Lil Nas X investiu mais ainda no artista, algo que provavelmente não aconteceria se os usuários do TikTok não tivessem alçado Old Town Road ao conhecimento do público comum.
Você deve estar se perguntando: mas será que isso pode realmente virar uma rotina?
Pois saiba que a resposta é sim.
A cantora Doja Cat, pouco conhecida no cenário mainstream, conseguiu o seu primeiro grande hit nos Estados Unidos graças ao sucesso de um desafio de dança no TikTok.
A canção Say So se tornou um hit orgânico nos charts da Billboard antes mesmo da gravadora escolher a música como single. A coreografia foi criada por uma pessoa dentro da plataforma, acabou viralizando e colocando a canção entre as mais ouvidas nas playlists de Spotify e Apple Music.
Com o ótimo desempenho – e sem grandes investimento até aquele momento – a faixa ganhou clipe e apresentação na TV americana, mostrando que o TikTok está, cada vez mais, pautando as músicas que se tornarão hits no cenário americano.
Empresa dona do TikTok lança seu próprio streaming
Lembra quando eu mencionei que o Tiktok possui 1 bilhão de usuários ativos mensais?
Sabendo desse potencial e tendo esses cases a seu favor, a empresa ByteDance criou um serviço de streaming próprio para atrair os usuários do TikTok – disponível, por enquanto, apenas na índia. Para as gravadoras, isso representará um custo menor para colocar em alta artistas para os quais não são dedicadas verbas exorbitantes de marketing. Para o mercado, o serviço de streaming se tornará um competidor de peso para o Spotify e Apple Music.
O mais impressionante nos casos listados acima é que todos esses desafios aconteceram organicamente, sem a interferência dos artistas em questão. O público da plataforma abraçou as canções, levando sua mensagem a novos públicos. Casos como o da Lizzo mostram que a rede social pode viabilizar uma segunda chance para artistas que não haviam conseguido fazer um sucesso estrondoso, mesmo com muitos anos de carreira.
O movimento de viralização de desafios não parece que vá parar, nem diminuir. Muitos outros artistas têm escolhido suas faixas para trabalho e divulgação por meio do barulho que elas causam dentro do TikTok.
É o caso do grupo Little Mix que, mesmo abandonando a divulgação do álbum por problemas com a gravadora, deu um clipe para uma das faixas favoritas do grupo entre os usuários da ferramenta; e da cantora Kesha que criou um lyric video há pouco tempo para uma faixa de 10 anos atrás, em função do sucesso que a música fez por lá.
O TikTok está se mostrando cada vez mais forte. Mesmo que não se torne a maior rede social do mundo, as ferramentas e o funcionamento do app chinês geram verdadeiros ensinamentos e servem como referência para trabalhos em outras mídias.
Por isso:
Se você trabalha com música, mas não está no TikTok, você está perdendo a oportunidade de ser descoberto pelo seu público-alvo.
Se você trabalha com marketing digital e quer encontrar novas formas de trazer alcance orgânico para o seu negócio, você deveria estar no TikTok.
Sou profissional de comunicação formada em Relações Públicas pela PUCRS. Tenho 27 anos, resido em Porto Alegre/RS e hoje atuo com planejamento de comunicação digital, produção de conteúdo e performance. Também ministro palestras, cursos e consultorias de marketing de conteúdo, marketing digital e relacionamento para empresas e marcas pessoais.